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Tecendo a vida

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Pai: lembranças a partir de um texto de Mia Couto


Viajando pela web, me deparei com este texto de Mia Couto. Imediatamente lembrei de meu pai que, em setembro deste ano completará dez anos que se tornou encantado. Guardei para postar em homenagem ao Dia dos Pais mas, ao rever a data em que havia encontrado, outra surpresa: 30 de julho, aniversário do meu pai !
Foi aí que dona Saudade, esta suave senhora que conta histórias daqueles que só podemos ver com os olhos do coração, chegou para me visitar... Lembrei das cômicas augruras de uma filha única de um pai coruja; lembrei do heroísmo de um homem comum, daqueles que não aparecem na mídia; lembrei de mim...
Compartilho, então, o texto sensível de um dos meus autores favoritos: Mia Couto.


"Era uma vez uma menina que pediu ao pai que fosse apanhar a lua para ela. O pai meteu-se num barco e remou para longe. Quando chegou í dobra do horizonte pôs-se em bicos de sonhos para alcançar as alturas. Segurou o astro com as duas mãos, com mil cuidados. O planeta era leve como uma baloa. Quando ele puxou para arrancar aquele fruto do céu se escutou um rebentamundo. A lua se cintilhaçou em mil estrelinhações. O mar se encrispou, o barco se afundou, engolido num abismo. A praia se cobriu de prata, flocos de luar cobriram o areal. A menina se pôs a andar ao contrário em todas as direcções, para lá e para além, recolhendo os pedaços lunares. Olhou o horizonte e chamou: — Pai! Então, se abriu uma fenda funda, a ferida de nascença da própria terra. Dos lábios dessa cicatriz se derramava sangue. A água sangrava? O sangue se aguava? E foi assim. Essa foi uma vez."

Mia Couto - Contos do Nascer da Terra.

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